sábado, 8 de outubro de 2011

CRÔNICA: Separatismos

SEPARATISMOS



            Acabo de assistir mais uma vez a Hotel Ruanda. Constato novamente que se trata de uma excelente produção. O filme, como é sabido, trata das questões separatistas na África. É sabido, também que os separatismos não ocorreram apenas nos países africanos. Eles aconteceram pelo mundo inteiro e inspiraram grandes conflitos, que hoje são excelentes temas para filmes, documentários ou aulas de história. E para crônicas.

            Claro que os separatismos não deixaram de ocorrer e não são fatos isolados. Pelo contrário, eles continuam existindo debaixo dos nossos narizes e, por nem sempre inspirarem grandes e horrendos genocídios, parecem menos relevantes. Mas eles não deveriam passar tão despercebidos. O que interessa é que quem pratica esse tipo de violência (bem, eu considero violência) ou é muito idiota ou não tem coisas mais úteis para se preocupar.

            Os separatismos aparecem em nossa sociedade alienada e fútil em aspectos que muita gente nem percebe. Fazemos distinção entre os iguais quando alguns têm acesso à comida e outros não. Há separatismo, também, quando reservamos cotas aos negros e índios nos vestibulares, como se não tivessem todos as mesmas capacidades intelectuais. Quando rotulamos as “coisas de homem”, as “coisas de mulher” e, agora, as “coisas de gays”, como se o gênero fosse decisivo para que alguém goste de futebol, novela ou música clássica. Quando achamos que quem gosta de rock não pode ir a um show de pagode, como se o ecletismo fosse proibido pela rotulação. Quando, nas escolas, distinguimos os professores de “área” e “currículo” (o que são termos um tanto antiquados) como se não tivessem (ou devessem ter) todos o mesmo objetivo de ensinar.

            Ocorre separatismo quando desvinculamos o que pensamos, o que falamos e como agimos, e isso nos faz parecer pessoas falsas, cujas atitudes nunca têm conformidade. Quando privilegiamos alguns por seu status social elevado, deixando de privilegiar quem realmente precisa, praticamos separatismo graças a nossa veia bajuladora. Praticamos separatismo quando não temos rampas e acessos adaptados a pessoas com necessidades especiais, pois, com essa atitude, deixamos implícito que essas pessoas não podem fazer parte de determinado ambiente.

            Enfim, deve-se avaliar o separatismo imundo que vem da fofoca, que surge da vontade que algumas pessoas têm de colocar uns contra os outros, de fazer com que os iguais pareçam diferentes. Quem julga o outro pela aparência ou pelos seus atos não se dá conta de que também é humano e que pode ser ou fazer exatamente o que o outro é ou faz. E isso pode ser, também, considerado separatismo genocida. Porque matar as raízes do que se considerava primordialmente ser “humano” pode ser considerado genocídio. E, no quesito “acabar com a humanidade”, nossa raça é especialista. O verdadeiro lixo da sociedade é quem trata os outros como lixo.

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