domingo, 27 de novembro de 2011

UM PEQUENO GRANDE AMIGO

UM PEQUENO GRANDE AMIGO



Era um sábado à noite. Estava jantando em uma ótima pizzaria quando precisei ir ao banheiro. Normal. Todo mundo vai a banheiros em restaurantes. Ao chegar lá, deparei-me com uma figurinha masculina, devia ter cerca de cinco anos, usava um engraçadinho moletom azul e parecia nervoso. Disse-me:

            - Tia, não pode entrar. A mãe do Lucas tá ali dentro.

            Na verdade, eu não queria saber quem estava no banheiro, até porque não era da minha conta. Eu também não pretendia entrar porta adentro e expulsar a tal mãe do Lucas dali. De qualquer maneira, crianças costumam repassar informações que parecem irrelevantes pra nós e que podem ser muito importantes para elas. Eu disse apenas:

            - Não se preocupe, meu amor. A tia espera.

            - Tia, a mãe do Lucas tá surrando ele!

            Esbocei uma cara de espanto, para que a criança não se sentisse ignorada. Aquela cara que a gente faz quando não tem o que dizer e, de certa forma, está constrangida, pois trata-se de uma criaturinha um tanto expansiva e nem tudo o que crianças alarmistas dizem é procedente. Ele disse:

            - Eu não vou deixar ela surrar o meu amigo!

            E começou desesperadamente a forçar a fechadura, dava afoitos jogos de corpo contra a porta, gritava. Tinha ódio. Tinha medo. Tinha coragem. Fazia o que parecia apenas um corriqueiro escândalo infantil. Entretanto, aquilo me pareceu muito maior do que um simples escarcéu.

            De qualquer maneira, comecei a ficar constrangida. Quando a mãe do Lucas saísse do banheiro, podia pensar que quem batia loucamente na porta e forçava a fechadura era eu. Pedi ao rapazinho que parasse com aquilo. E ele argumentava que não podia parar, tinha que fazer alguma coisa por seu amigo. Quando a “algoz” do menininho abriu a porta do banheiro, (e não parecia que ela estivesse praticando nenhum ritual de tortura) o menino fez o óbvio: saiu correndo. Mas, bem, tinha feito sua parte.

Mas uma coisa não se pode negar: o que parecia apenas um corriqueiro estardalhaço infantil era, na verdade, uma baita demonstração de amizade. E, vindo de uma criança escandalosa, muito sincera, por sinal. Boa parte dos adultos não moveria um dedo, ou pior, viraria as costas ao perceber um amigo em “situação de perigo”. Para estes, é bem mais fácil se omitir em vez de abrir a boca para ajudar, defender ou livrar alguém de uma fria. Eles têm medo de se expor ou de se complicar ao fazer alguma coisa por um amigo. Para considerável parte dos adultos de hoje em dia, amigos valem menos que bons carros, roupas de grife, viagens ao exterior, joias, dinheiro, cargos ou espaços em colunas sociais. Em contrapartida, o que vem das crianças é sincero. E, ao menos em tese, ainda há pureza nas atitudes delas, portanto eles ainda acreditam em amizades verdadeiras.

Olha, Lucas, eu não sei bem quem você é, acho que você ainda nem sabe ler pra entender o que eu escrevo hoje. Talvez, quando você aprender ler, poderá acabar se interessando por este texto. Mas, talvez, nem se lembre dessa situação que viveu. Bem, eu só quero te dizer uma coisa: diferentemente da maioria das pessoas que eu conheço, você tem um amigo de verdade. E, em dias em que se valoriza tanta coisa besta nessa vida, vale a pena ter um amigo.